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Prostituta


Os primeiros raios de sol que faziam nascer a manhã beijavam lhe o rosto e lembravam-na de que era hora de regressar a casa.


Apática e com o coração pesado da desilusão, ela aguardava que a água do duche (da praxe) aquecesse. O banho não a fazia sentir mais limpa e a fonte do seu lucro não lhe trazia qualquer tipo de orgulho. Mas o desespero falava mais alto e, sem querer, ela deu por si a rever mentalmente aquela noite.


Tudo mudou após aquele encontro e ela não conseguia pensar em mais nada. Mesmo quando dormia, era assombrada por flashbacks daqueles momentos. Se para qualquer pessoa apaixonar-se era um sonho, para ela, era um pesadelo que lhe conferia a incapacidade de imparcialidade de sentimentos exigida na sua profissão.


Ela não podia apaixonar-se, não podia desejá-lo daquela forma nem imaginar constantemente que era para ele que se despia, sempre que estava com um novo cliente. Tratou-a como uma mulher e não como um pedaço de carne, como habitualmente os homens faziam e cuja única ânsia era atingir o prazer e satisfação sexuais. E isso despertou a sua atenção e o seu coração já há muito adormecido.


Ele era diferente e de uma só vez conseguiu despir-lhe não só o corpo mas também a alma. E ela não tinha a certeza de mais nada a não ser da vontade de o voltar a ver e sentir, mesmo que fosse novamente naquele beco.


Várias questões flutuavam na sua mente... Seria ele casado? Estaria envolvido em tamanha carência para achar que a sua saída seria recorrer a mulheres como ela? Teria ela sido escolhida ao acaso entre as colegas de profissão? Algo não fazia sentido. Ele não lhe parecia um homem que precisasse de "carinhos pagos". Era bem constituído, bonito e as poucas palavras proferidas denotavam educação. Teria ele sentido o mesmo que ela? Tentava afastar todas as questões e pensamentos da mente. Afinal de contas, paixões não pagam dívidas e era preciso continuar a trabalhar para as poder liquidar.


Nenhuma outra mulher podia imaginar a mágoa que enchia o seu coração. Estar apaixonada por um homem e ter de se deitar com outros por necessidade financeira, é de facto a maior condenação que ela podia ter, um verdadeiro inferno, que lhe causava um atrito constante entre o corpo e a alma.


Nas noites seguintes, no local habitual, o seu coração sobressaltava a cada carro que perto dela abrandava. Queria que fosse ele. Debatia-se com a ideia de estar apaixonada e o seu inconsciente "levava-a" para fora dali, daquela vida, daquela profissão, com ele. Os seus pensamentos divagavam entre aquela noite, com aquele homem que nem conhecia e entre a possibilidade de um futuro juntos (como se isso fosse possível...). "Lá" eles eram um casal normal, com empregos comuns e uma casa, não muito grande, mas acolhedora e onde o amor prosperava.


Certa madrugada, enquanto retocava a maquilhagem, o bater da porta de um carro fê-la voltar à realidade. Era ele! As suas pernas ficaram bambas e a sua face petrificou numa expressão de incredibilidade. A ansiedade era evidente no rosto dele também. E sem dizer uma palavra, ele começou a afastar-se do carro e a caminhar na sua direcção... Estancou à sua frente e nem um palmo separava as suas bocas. Nesse momento, ela percebeu a súplica no seu olhar e a carência que ele também sentira dela...

Liz Pereira


Origem da imagem: Pixabay

Edição: Liz Pereira

 A blogger: 

Introvertida aspirante a escritora que tende a confiar mais no papel do que nas pessoas. Apreciadora de produtos de beleza, música que arrepia, trocadilhos e clichés, ela sonha viajar pelo mundo e conhecer lugares que lhe alimentem a inspiração, o saber e a alma.

Liz Pereira
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